A mania de Simão
era ler quando podia,
até o que não devia:
contrariando seu patrão
leu um livro de magia.
Mas foi tanta a confusão,
que só quem gostar de ler
saberá a solução.
Era uma vez um rapaz muito inteligente que se chamava Simão. A
coisa de que ele mais gostava e de que tinha verdadeira paixão era de ler
livros. Um dia Simão se deu conta de que já tinha lido todos os livros que
pudera encontrar no lugarejo onde morava. Ficou pensando em como resolver aquele
problema. Acabou tendo a idéia de ir para a cidade mais próxima e procurar
emprego numa livraria.
Despediu-se do pai e partiu.
Chegando na cidade vizinha, pos-se a andar pelas ruas até
encontrar uma livraria. O proprietário era um tipo estranho com uma coruja no
ombro. Mas para Simão a única coisa importante era poder trabalhar no meio dos
livros, por isso indagou ao homem:
-O senhor me aceitaria como empregado na sua loja?
- Claro, rapaz. E, como vou lhe ensinar muitas coisas,
chame-me de mestre.
No
dia seguinte, quando Simão se apresentou para trabalhar, o dono da livraria lhe
disse:
- Para começar você precisa apenas manter a ordem na loja:
espanar os livros, os móveis, varrer o chão, enfim, fazer coisas muito simples.
- Sim, mestre, farei tudo direitinho. . . mas posso ler alguns
livros quando terminar o meu trabalho?
- Que pedido estranho para um rapaz! - admirou-se o mestre. -
Está bem, concordo. Pode ler tudo o que quiser. Mas terá que me prometer que por
nenhum motivo, nem por nada no mundo, você vai mexer. . .
Simão respondeu bem depressa:
- Está bem,
mestre, eu prometo.
- Que é isso? Você nem me deixou acabar de falar. Você pode
ler todos os livros, menos aquele livrinho vermelho que está ali na prateleira
de cima. Prometa-me isso e seremos sempre amigos.
Simão fez sua promessa de muita boa fé. De fato, durante todo o tempo em que o
mestre esteve na loja, Simão nem olhou para o livrinho vermelho. Quando o mestre
saiu, para ir cuidar de outros negócios, Simão sentiu uma vontade muito grande
de ler o livro proibido, nem que fosse só um pouquinho.
E aquela vontade foi aumentando e tomando conta de seu pensamento, a tal ponto
que ele não conseguia trabalhar direito.
Cada vez que Simão olhava o livrinho no alto da prateleira, pensava:
- Não há mal nenhum em dar uma espiadinha no que está escrito no livro.
Mas
a consciência de Simão protestou:
- Simão! Simão! Eu sou sua consciência, não se esqueça em que prometeu não mexer
naquele livrinho vermelho.
Mas a curiosidade também não ficou quieta:
- Eu sou a curiosidade e estou morrendo por saber o que está escrito lá.
Vamos, Simão, coragem, dê uma olhadinha só.
O pobre Simão não sabia o que fazer entre a vontade de obedecer à consciência e
manter sua palavra e a intensidade com que a curiosidade tomava conta dele. Era
como se as duas estivessem aos gritos:
- Seja obediente, Simão e cumpra a promessa!
- Não seja bobo, Simão! Pegue o livro, abra e leia!
Simão não aguentou mais. A curiosidade venceu. Pegou o livro e quando viu do que
se tratava pos-se a cantar e pular:
" O Manual do Mágico Perfeito". . . Por acaso está escrito em
árabe, ou então pertenceu, pelo jeito, a antigo e rico marajá,desses cuja língua
ninguém sabe?
Poderei ser mágico, se ler estas fórmulas com atenção. Que sorte,
agora tenho poder de transformar-me até num dragão; um, dois. . . três, olhem só
o que verão!
Pulou e saltou de alegria até cair no chão. Que beleza! O livrinho continha a
fórmula mágica para se transformar em animal, pessoa ou objeto. O patrão de
Simão era um mago e o rapaz achava, agora, que podia se tornar muito poderoso.
Logo de cara Simão decidiu que queria ser um bicho que voasse. Assim voltaria
para a casa do pai bem depressa, sem esquecer de levar no bico o livrinho
mágico. Escolheu ser andorinha, que era um bicho que voava rápido. Subiu na
beirada da janela, com o livro na boca e pronunciou as palavras mágicas:
- Enha anha onhe inha andorinha.
Num instante Simão sentiu os braços transformarem em asas. Virou uma andorinha,
que sem largar o livrinho do bico, voou da beirada da janela em direção à casa
do pai. Imaginem só o espanto do pai quando viu uma andorinha entrar pela porta
e pousar em cima do banco e ali diante de seus olhos transformar-se em seu filho
Simão.
Oi, papai! Está contente em me ver?
-Não estou entendendo nada, nem sei como você está aqui.
- Alegre-se papai, acabaram-se os dias tristes, voltei para torná-lo rico e
feliz.
- Acho tudo isso muito bom. Mas me dê um pouco de tempo para pôr as idéias em
ordem. Por falar nisso, como vamos ficar ricos?
Simão
desceu do banco, abraçou o pai com muito carinho e indagou:
- O senhor gostaria de ser dono de um boi gordo para vender no mercado amanhã?
- Claro que gostaria, mas ninguém vai me dar um boi assim de presente.
- Pois aí é que está o segredo - explicou Simão.
- Amanhã eu faço uma mágica e me transformo num boi gordo.
O senhor me leva ao mercado e me vende. O boi terá um lacinho vermelho amarrado,
na pata. Quando o senhor tiver feito o negócio, tire o lacinho da pata do boi e
volte para casa. Mas muita atenção, papai, não vá esquecer o lacinho.
- Ora, Simão, que é isso? - respondeu o pai. - Se você é capaz de se transformar
num boi gordo, eu também posso não esquecer o lacinho.
No dia seguinte o pai levou ao mercado um belíssimo boi. Logo apareceram vários
compradores que examinaram o animal com atenção e concluíram que era mesmo
saudável e estava em perfeitas condições. Um deles perguntou:
- Por quanto você vende este boi?
-
Por um saquinho de moedas de ouro, mas no preço não está incluído o lacinho
vermelho que ele tem amarrado na pata.
Meia hora depois o pai estava de volta muito satisfeito, contando as moedas de
ouro. Mas o coitado que tinha comprado o boi e pago tão bom preço por ele coçava
a cabeça e não entendia como o boi podia ter desaparecido. Procurou o animal por
toda parte e nem rastro do boi. Era como se o bicho tivesse desaparecido no ar.
Enquanto isso Simão corria para casa.
Simão
estaria muito contente se não fosse a consciência que cochichava no seu ouvido:
- O que você fez não é nada bonito, sabe como se chama? Roubo, furto, trapaça.
- Deixe de conversa, consciência, o que está feito está feito.
- Preste atenção, Simão, coisas assim se pagam mais cedo ou mais tarde.
Mas Simão estava chegando em casa e foi logo gritando para o pai:
- Que tal, papai, levarmos um cavalo para vender no mercado?
o dia seguinte o pai levou ao mercado um lindo cavalo branco e pos-se a
anunciar:
- Quem quer comprar um cavalo? Vejam que animal forte e robusto!
- Deve comer muito!
De repente o cavalo começou a mostrar-se inquieto, embora o pai tentasse
segurá-lo.
Isso
acontecia porque Simão tinha visto seu patrão aproximando-se. Conforme o mago o
olhava, mais o cavalo se mostrava assustado. Simão, sem saber o que fazer,
pensava:
- Nossa! É o mestre! Ele me reconheceu!
O
mago aproximou-se do pai de Simão e disse:
- Esse cavalo me interessa.
O pai de Simão logo tentou fazer negócio.
- É um belo animal; se o comprar, vai ficar satisfeito.
Simão saltava para todos os lados, o que levou o pai a explicar:
- Hoje está um pouco nervoso, mas, de costume é dócil.
O mago, que estava interessado em Simão e não no cavalo, então indagou:
- Quanto quer por ele?
- Um
saquinho de moedas.
- Fico com ele - disse o mago.
- Deixe-me tirar esse lacinho vermelho da pata.
- Pode deixar o lacinho na pata.
- Não está incluído no preço.
- Eu lhe dou dois saquinhos de dinheiro, mas deixe o lacinho na pata.
- Está bem, negócio fechado.
O pai de Simão tinha concordado porque achou que o filho saberia dar um jeito de
voltar à forma humana. Mas estava enganado. Enquanto o cavalo tivesse o lacinho
vermelho amarrado na pata, o rapaz não podia transformar-se. Sabendo disso,
Simão tentou fugir de todo jeito, mas o mago o fez segurar por dois homens, que
o levaram à força para o estábulo.
Banquei foi um desmiolado ao fazer tantas bobagens, querendo
tirar vantagens acabei sendo o enganado.
Em um cavalo virado, relincho e não sou capaz de, outra vez
transformado, voltar a ser um rapaz.
E se o mago me faz virar monstro, por magia? Não sei como se
desfaz o que fiz por fantasia.
Simão estava arrependido de ter tentado engabar os outros e pensava:
- Se eu conseguir escapar daqui, nunca mais farei magia.
Foi ent~]ao que um menino entrou no estábulo para vir espiar o vavalo. Simão
mostrou-se muito manso e o garoto, pedendo o medo, fez um agrado no pescoço do
cavalo. Era a ocasião. Simão, batendo com a pata no chão, chamou a atenção para
o lacinho vermelho: O garoto entendeu:
- Parece que o cavalo quer que eu tire essa fita da pata dele.
Tirou mesmo e ficou espantado com o que viu. O cavalo desapareceu e em seu lugar
o menino só viu uma andorinha. O pássaro voou e foi embora.
Quando
o mago ficou sabendo o que tinha acontecido, puxou a barba furioso. Depois se
transformou num gavião e saiu voando em perseguição da andorinha.
Simão se deu conta de que aquele gavião, que o perseguia, só podia ser o mago,
mesmo porque o gavião estava de óculos. A andorinha fugiu o mais rápido
possível, mas cada vez o gavião estava mais perto.
Tudo parecia
perdido.
Nesse instante Simão percebeu que estava voando sobre o jardim do palácio real,
onde a princesa estava colhendo flores.
Teve uma idéia. Pronunciou as palavras mágicas para se tranformar, que tinha
aprendido no livrinho secreto:
- Nil nol nul nal nel anel.
No mesmo instante se transformou num anel.
O anel caiu exatamente no colo da princesa, que o pegou admirada.
Depois
de examinar o anelzinho, colocou-o no dedo.
O mago que vira tudo pensou:
- O rapaz arranjou um bom meio de escapar, mas isto não vai ficar assim.
Em seguida pronunciou as palavras mágicas para transformar-se:
Jivem jevem juvem javem jovem.
Foi dizer e acontecer. O mago se transformou em um jovem senhor. Mas como antes
estava no ar, feito gavião e os jovens não tem asas, despencou lá das alturas.
Conseguiu, com sua magia, controlar a queda e desceu sobre a grama com
suavidade.
Foi
assim que surgiu, vindo do céu, diante da princesa, que ficou olhando-o no maior
espanto. Antes que a moça pudesse dizer qualquer coisa, o mago, com muita
cortesia, resolveu dar uma explicação:
- Linda jovem, estou aqui para pedir-lhe o favor de devolver-me o anel que perdi
quando me divertia em jogá-lo ao ar.
Embora a desculpa fosse fraca, a moça estava muito surpreendida com aquele homem
que descera do céu. Por isso ia entregar o anel sem mais explicações.
Antes que a moça desse o anel ao mago, Simão resolveu transformar-se para poder
escapar e disse:
Trão frão brão zrão grão.
O anel no dedo da princesa tornou-se um grão, que o vento carregou para entre
duas pedras.
O mago não perdeu tempo e foi logo pronunciando a fórmula mágica:
Elo ilo olo ulo alo galo.
No
mesmo instante pos-se com o bico a procurar o grão no meio da relva. Queria
comê-lo. Antes que o encontrasse, Simão exclamou:
- Ebo abo ibo ubo obo lobo.
O grão virou um enorme lobo e sem dar tempo ao mago para se transformar em
qualquer outra coisa, o lobo liquidou o galo. Então Simão gritou:
- Ao uo ao io ao Eu.
E assim recuperou sua forma humana. Era outra vez um rapaz.
Mas Simão aproveitou a magia para aparecer com ricos trajes. Ajoelhou-se diante
da princesa, dizendo:
- Agradeço de todo coração por ter-me salvo, pondo o anel em seu dedo.
Naquele mesmo instante em que se viram, os dois jovens se enamoraram. Simão
pediu a princesa em casamento e a moça concordou.
Os dois noivos queimaram o livrinho mágico, pois não queriam mais saber de
encantamentos. Casaram e viveram felizes.
Simão agora casado, não quer saber de magia, queimou o livro
encantado. Continua sempre lendo estórias de fantasia ou livros educativos, pois
tem muitos motivos pra temer a bruxaria.
Ludwig Bechstein
contandohistoria.com
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domingo, 12 de janeiro de 2014
História: O Aprendiz de Magia
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